sexta-feira, 29 de junho de 2018

A HISTÓRIA DA CASA CENTENÁRIA


A Casa Centenária, localizada na propriedade hoje conhecida como Fazenda Sacramento, Bairro Rodeio 12, Rodeio/SC, foi construída por volta de 1903 pelo imigrante trentino Francesco Fortunato Longo. Eis a história da sua imigração para o Brasil e detalhes sobre como a casa foi construída.

As origens da imigração trentina e a viagem até Rodeio
Francesco tinha 13 anos quando chegou ao Brasil. Nasceu em 06 de janeiro de 1862 em Castelnuovo Valsugana e era o filho mais velho de Giovanni Longo (nascido em Castelnuovo Valsugana, 1832) e Elisabetta Longo (nascida Girardon em Ospedaletto 1835), agricultores e católicos.


Registro oficial na Província de Trento

Junto com 4 irmãos mais novos (Monica, Gio Batta, Antonio e Giuseppe), a família Longo fazia parte de um grupo de imigrantes italianos que viajou de Trento até Marseille, França onde embarcou no vapor francês Ville de Santos em 11 de junho de 1875.

"Ville de Santos"

Na época, a região do Tirol Meridional pertencia ao Império Austro-Húngaro (1867-1918) e por isso na relação de passageiros a família Longo consta como sendo austríaca.
O Ville de Santos ainda fez uma escala em Le Havre onde mais passageiros embarcaram. Depois seguiu viagem em 18 de junho, com 279 imigrantes, sendo 216 tiroleses, 28 franceses, 31 italianos e 4 suíças.


Roteiro do Ville de Santos em junho-julho 1875
Imigrantes desembarcando no porto de Santos

Lista de passageiros registrada no Arquivo Nacional, Rio de Janeiro, certificada pelo capitão francês Bugault, comandante do Ville de Santos.

Ofício do Arquivo Nacional, Rio de Janeiro
Lista de passageiros desembarcados

Após aportar no Rio de Janeiro em 16 de julho de 1875, grande parte dos tiroleses foi levada até Itajaí seguindo depois para Blumenau em carroças. Na última etapa da longa jornada, o grupo foi conduzido até Timbó para que cada um escolhesse o seu lote de terra em meio à floresta virgem. Esta turma de 34 famílias finalmente chegou a Rodeio no dia 15 de setembro de 1875 e foi o segundo dos três grupos de imigrantes que inicialmente povoou este local trazendo um total de 114 famílias.


Imigrantes sendo transportados por carroças

Rodeio pertencia à Colônia de Blumenau, nome dado em homenagem ao Dr. Hermann Blumenau, administrador alemão que viabilizou a colonização da região através de contratos celebrados com o Imperador do Brasil e organizou a distribuição das terras aos imigrantes.


Divulgação de emigração gratuita para o Brasil


Os lotes foram numerados de 1 a 120 sendo que o Lote 12 ficou reservado para uma escola e cemitério, ponto central do bairro que hoje é conhecido como Rodeio 12. Giovanni Longo e sua família receberam o Lote 23.

Giovanni Longo, primeiro à esquerda, fila de trás
Giovanni Longo (com a mão no cavalo) numa visita do padre

Após uma longa vida em Rodeio, Francesco Longo mudou-se para Rio dos Cedros e faleceu em 17 de julho de 1953 aos 91 anos. Seu corpo foi enterrado no cemitério da Capela de Santo Antônio, Rio dos Cedros/SC. Vale observar que a data de nascimento gravada no túmulo é a mesma que está nos registros da paróquia em Trento onde Francesco nasceu.




A Construção da Casa Centenária

A “casa di mattoni” (casa de tijolos à vista), foi originalmente construída com 65m2 e um generoso pé direito de 3,65m que proporciona ambiente bem fresco nos dias mais quentes.



Era composta por 3 cômodos, sendo uma sala na entrada, quarto de um lado e a cozinha do outro. O sótão era utilizado para secar folhas de fumo.


Quarto ainda com os tijolos originais

A base da casa foi construída sobre pedras retiradas e rachadas no próprio terreno. Sobre as pedras foram assentados tijolos e vigotas de madeira.



Toda a madeira utilizada é de Canela Preta (Ocotea catharinensis), árvore nativa que resulta em material de grande resistência, excepcional durabilidade e que não racha com facilidade. Algumas árvores eram levadas por carroça através de picadas no mato até à serraria onde os troncos eram cortados em tábuas para assoalho. Já as peças estruturais (caibros) eram abertas a golpes de machado.



Estrutura de madeira (telhado) :
14 barrotes de canela de 19cmx19cm com 6,30 metros de comprimento
28 caibros de 14cmx12cm com 3,65 metros de comprimento

Paredes
Sobre as pedras estão assentadas paredes duplas de tijolos e para erguer a casa toda foram necessários cerca de 11.000 tijolos, fabricados in loco.




O barro era retirado do solo, transportado em carrinhos de mão, amassado com os pés e colocados em formas de madeira para secar. Os tijolos eram então queimados em fornos e usados na construção.


Forma de tijolo
Fornos para queimar tijolos
Argamassa
O assentamento dos tijolos foi feito com massa preparada com barro, cal e areia. A areia era retirada de manhã cedo do rio que passa perto da Igreja de Rodeio 12, espalhada para secar e ensacada e levada morro acima no final do dia de trabalho. Quanto esforço !

E assim foi erguida a Casa Centenária !


Referências bibliográficas

Depoimento de Hipólito Longo, neto de Francesco Longo, em Navegantes, junho 2009.

http://www.briatore.net/ (Geucimar Brilhador)

Vencer ou Morrer (Renzo Maria Grosselli)

FINARDI, José E. Os primeiros Moradores de Rodeio, in Blumenau em Cadernos, Tomo XVIII, Nº 10, p. 324-332, Outubro 1977.

Rodeio Vale dos Trentinos (Iracema Moser Cani)

Arquivo Nacional, Rio de Janeiro

Artigo publicado no jornal A Tribuna de Santos em 3/6/1993 (Ville de Santos)

blog.cybershark.net/ida/index.php/archives/394 (fotocolorida Ville de Santos)

http://www.natitrentino.mondotrentino.net/